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quinta-feira, 29 de setembro de 2011

O Que Quer Uma Mulher?







Um bebê nasce. O médico anuncia: é uma menina! A mãe da criança,

então, se põe a sonhar com o dia em que a sua princesinha terá um

namorado de olhos verdes e casará com ele, vivendo feliz para sempre.

A garotinha ainda nem mamou e já está condenada a dilacerar corações.

Laçarotes, babados, contos de fadas: toda mulher carrega a síndrome de

Walt Disney.

Até as mais modernas e cosmopolitas têm o sonho secreto de encontrar

um príncipe encantado. Como não existe um Antonio Banderas para todas,

nos conformamos com analistas de sistemas, gerentes de marketing,

engenheiros mecânicos. Ou mecânicos de oficina mesmo, a situação não

anda fácil. Serão eles desprezíveis? Que nada. São gentis, nos ajudam

com as crianças, dão um duro danado no trabalho e têm o maior prazer

em nos levar para jantar. São príncipes à sua maneira, e nós,

cinderelas improvisadas, dizemos sim! sim! sim! diante do altar; mas,

lá no fundo, a carência existencial herdada no berço jamais será

preenchida.

Queremos ser resgatadas da torre do castelo. Queremos que o nosso

pretendente enfrente dragões, bruxas, lobos selvagens. Queremos que

ele sofra, que vare a noite atrás de nós, que faça tudo o que o José

Mayer, o Marcelo Novaes e o Rodrigo Santoro fazem nas novelas.

Queremos ouvir "eu te amo" só no último capítulo, de preferência num

saguão de aeroporto, quando ele chegará a tempo de nos impedir de

embarcar.

O amor na vida real, no entanto, é bem menos arrebatador. "Eu te amo"

virou uma frase tão romântica quanto "me passa o açúcar". Entre

casais, é mais fácil ouvir eu "te amo" ao encerrar uma ligação

telefônica do que ao vivo e a cores. E fazem isso depois de terem se

xingado por meia-hora. "Você vai chegar tarde de novo? Tenha a santa

paciência, o que é que você tanto faz nesse escritório? Ontem foi a

mesma coisa, que inferno! Eu é que não vou prepar o jantar para você

às dez da noite, te vira. Tchau, também te amo." E batem o telefone

possessos.

Sim, sabemos que a vida real não combina com cenas hollywoodianas.

Sabemos que há apenas meia dúzia de castelos no mundo, quase todos

abertos à visitação de turistas. Sabemos que os príncipes, hoje, andam

meio carecas, usam óculos e cultivam uma barriguinha de chope. Não são

heróicos nem usam capa e espada, mas ao menos são de carne e osso, e a

maioria tentaria nos resgatar de um prédio em chamas, caso a escada

magirus alcançasse o nosso andar. Não é nada, não é nada, mas já é

alguma coisa.

Dificilmente um homem consegue corresponder à expectativa de uma

mulher, mas vê-los tentar é comovente. Alguns mandam flores, reservam

quarto em hotéizinhos secretos, surpreendem com presentes, passagens

aéreas, convites inusitados. São inteligentes, charmosos, ousados,

corajosos, batalhadores.

Disputam nosso amor como se estivessem numa guerra, e pra quê? Tudo o

que recebem em troca é uma mulher que não pára de olhar pela janela,

suspirando por algo que nem ela sabe direito o que é. .........

Perdoem esse nosso desvio cultural, rapazes. Nenhuma mulher se sente

amada o suficiente.


(Martha Medeiros)

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Eu escrevo como se fosse para salvar a vida de alguém, provavelmente a minha própria vida.( Clarice Lispector)